Subiu a cortina

Caro leitor,

Seja bem vindo ao mundo das cordas, madeiras e metais. Aqui você encontrará minhas impressões sobre diversos concertos de música erudita realizados na cidade do Rio de Janeiro. Também compartilhará dos meus devaneios sobre o mundo dos clássicos e algumas dicas de programas, filmes e discos. Só peço a cortesia de fazerem silêncio durante o concerto (e nada de ficar desembrulhando balinhas). Obrigada!

terça-feira, 21 de julho de 2015

N-gram sinfônico

Sempre tive uma certa dificuldade para entender porque algumas pessoas não gostam de música clássica. Segundo uma palestra do Benjamin Zander na plataforma TED (muito boa, por sinal, recomendo!), apenas 3% da população se considera amante da música clássica. Os outros 97% se dividem entre pessoas que não ligam, nunca ouviram ou não gostam. Para os otimistas como eu, isso significa que há um potencial enorme de crescimento!

No entanto, parece que estamos caminhando para o lado oposto. Diariamente escuto relatos de orquestras falindo, gravadoras fechando, concertos vazios e falta de espaço e investimento. Ao que tudo indica, há menos interesse hoje pela música clássica em relação ao passado e muitas pessoas, incluindo músicos, compositores e produtores acreditam que essa arte (principalmente orquestras sinfônicas) não sobreviverá a mais uma ou duas gerações. Essa afirmação me causa pavorosos arrepios!

Resolvi investigar se o interesse geral pela música clássica está realmente em queda. Na verdade, queria uma desculpa para usar uma ferramenta superlegal do Google chamada N-gram Viewer. Ao colocar uma palavra-chave nesse brinquedinho, ele escaneia toda a literatura mundial que já foi digitalizada pelo Google e outras iniciativas e disponibiliza o resultado em termos percentuais (número de livros que citaram a palavra-chave em relação ao número de livros publicados naquele ano) por ano. Em outras palavras, quanto mais alto o n-gram, mais popular é o assunto durante aquele período. OBS: Sim, eu sou nerd e esse tipo de coisa me diverte.  

Comecei a minha busca pelo termo “música clássica” (sempre em inglês pois há mais referências para formar uma tendência geral), no período entre 1800 e 2008. O gráfico resultante me deixou animada pois mostrava uma nítida tendência de crescimento do interesse ao longo do tempo, com uma ligeira queda na última década.



No entanto, me dei conta que o termo talvez não fosse o mais apropriado haja vista que mudamos a forma como nos referimos à música clássica. Afinal, no século XIX, a música de Beethoven não era chamada de “clássica”, só para citar um exemplo. Então tentei de novo, usando termos que não mudaram tanto ao longo do período de busca como “ópera”, “concerto”, “orquestra” e “sinfonia” e o resultado foi bem diferente.



A primeira coisa que chama atenção é que a ópera parece ter sido sempre mais popular do que as demais “modalidades”. Fica a dica para a diretoria do Theatro Municipal do Rio de Janeiro voltar a produzir algumas... Em seguida, reparamos que o comportamento das quatro curvas é quase idêntico, apresentando um aumento gradativo de citações desde 1800 até o pico de interesse em meados da década de 1940. Desde de então, infelizmente, só declínio para todos.

A título de curiosidade, resolvi investigar os compositores mais famosos para saber como ficaria essa relação ao longo desses dois séculos... e não é que fica igualzinho! Pelo jeito, os anos dourados da música erudita foram mesmo na década de 1940 (pelo menos de acordo com o meu método de pesquisa infalível e super científico). E agora a perguntinha que não quer calar: por quê?



O que estava acontecendo no mundo ocidental nesse período que poderia ajudar a explicar o solo fértil para a música clássica e por que ela não continuou sendo de interesse da população em geral nas décadas seguintes? Será que o nível de interesse atingiu um novo patamar ou será que continuará a cair? Os fatores que causam esse declínio são os mesmos há 70 anos ou será que foi uma sequência de eventos, acontecimentos e mutações? Podemos reverter essa tendência? Como?

Acho que chega de ponto de interrogação por hoje. Vou estudar mais um pouco e pedir ajuda aos universitários e volto em breve para continuar a nossa prosa. Enquanto isso, vejam no link abaixo a tal palestra do Benjamin Zander que comentei no primeiro parágrafo. É uma das minhas prediletas.


terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Novos ventos no rumo certo

Algo está no ar neste início de 2015. Como todo ano nesta época estou sofrendo com a abstinência de concertos e me preparando para o início de temporada das grandes orquestras da cidade. No entanto, há um rebuliço inquieto que me intriga.

Dentre tantas notícias negativas de orquestras em crise financeira, patrocínios escassos, mudanças duvidosas na Lei Rouanet e cortes orçamentários na cultura estadual, artistas e produtores estão se apropriando de novas ferramentas, atrativos e recursos para tirarem seus projetos do papel. Financiamento coletivo, auto-promoção, videos no youtube, concertos virtuais, comunicação interativa entre mídias, perfis em redes sociais são corriqueiros na música popular mas estão apenas começando a ganhar força entre as instituições, grupos e artistas que produzem e tocam música clássica no Brasil.  

A seguir, algumas boas iniciativas que chamaram minha atenção nos últimos meses. Se o leitor souber de outras, por favor me avise!



O Trio Capitu é um trio de sopros (flauta, oboé e fagote) composto por mulheres extremamente dedicadas, caprichosas e inovadoras. Sofia Ceccato, Janaína Perotto e Débora Nascimento não pouparam esforços desde a feliz escolha do nome carregado de cultura brasileira, passando por fotos e videos bem produzidos, sempre com um repertório diversificado incluindo peças encomendadas e arranjos sob medida. Acompanho o projeto desde a sua origem em 2012, curto a página no Facebook, assisto aos vídeos que elas postam no Youtube, fui a concertos e acompanhei o sucesso da série de concertos didáticos patrocinados pela Funarte em 2014. Agora, o conjunto está promovendo um financiamento coletivo para produzirem o seu primeiro CD. Eu já dei meu apoio. Segue o link para quem quiser conhecer o projeto e dar uma contribuição: http://benfeitoria.com/triocapitu



A Johann Sebastian Rio é uma orquestra de câmara que nasceu em novembro de 2014 de forma muito misteriosa espalhando a pergunta "o que está faltando no Rio de Janeiro?" pelas redes sociais. A resposta veio em forma de vídeo, deixando muita gente com água na boca pela versão ao vivo (e por vê-los tocando Bach, já que a estréia virtual foi com Vivaldi). O grupo que reúne alguns dos meus músicos prediletos (não vou citar nomes para não criar ciúmes, rssss...) tem tudo para dar certo na busca da inovação na relação com o público, na apresentação visual da música de concerto e na valorização dos indivíduos dentro do grupo. Enquanto não temos a chance de assistí-los em uma sala perto de casa, segue o link para o vídeo de estréia: https://www.youtube.com/watch?v=Ida0A2iKwF0. A produção prometeu uma surpresa para fevereiro e eu estou louca para saber o que é!


O Art Metal Quinteto não é nenhum debutante. Comemorou 20 anos de estrada em 2014 mas a inovação, o bom humor combativo e a criatividade, além de uma competência estonteante, são traços marcantes do grupo. O último CD do quinteto (disponível também pelo itunes, deezer, rdio e spotify) é resultado de um minucioso trabalho de pesquisa, adaptação e execução que trouxe de volta à vida a obra do Henrique Alves de Mesquita. Como se isso não fosse suficiente, o trompista Antonio J Augusto lançou a biografia desse compositor brasileiro do século XIX que complementa e contextualiza a música resgatada pelo conjunto. Será que sai também em formato de e-book? Enquanto isso, segue uma das minhas prediletas do repertório desses cinco artistas tocada ao vivo na Escola de Música da UFRJ: https://www.youtube.com/watch?v=ukY8w87uZro.

Ao que parece, a música erudita está aos poucos chegando no século XXI. Resta saber se o seu público vai acompanhar sem preconceitos. No que depender de mim, teremos antigos e novos seguidores "curtindo" cada concerto, post e link!

PS: Antes que me acusem de ser puxa-saco dos meus amigos, admito que é verdade! Afinal, eu acho meus amigos o máximo... Então venha ser meu amigo você também e me conte sobre os seus projetos inovadores.